Domingo é dia de feira. Faça chuva ou faça sol, lá estão os produtores montando suas bancas de bananas, tomates, cebolas e abobrinhas.
Começam bem cedinho e vêm dos mais arredores da cidade. Alguns vêm de kombi, outros de caminhonete, todos com suas caixas cheias.
Ir à feira é viver uma verdadeira aventura de exploração da existência humana. Uma riqueza de experiências e detalhes dignos dos melhores filmes de cinema.
E tem a senhora que foi acompanhada com seu cachorrinho, ela só com uma sacola, mais interessada em olhar os preços do que comprar, ele com seu focinho farejador, mais interessado em explorar do que em seguir com a dona.
O senhor que prepara os churrasquinhos fazendo o cheiro de carne espalhar pelo ar, tipo nos desenhos do Tom e Jerry, e hipnotiza homens e mulheres que fazem fila às 8h da manhã.
Tem as filosofias sobre relacionamento e sobre as mulheres… sobre ser um homem casado “direito” que fica em casa bebendo cachaça tranquilo, tranquilo… “melhor assim, sô, que não dá problema com a patroa”.
O senhor que vai de mãos dadas com o seu netinho, ele com seus 8 anos ainda não tem dimensão do que é uma feira, mas acompanha com seus olhos atentos cada movimento e cada instrução do seu avô, que conta as pratinhas e entrega na mão do neto para ele pagar o que compraram.
A comadre encontra a comadre, abraços abraços, e tricotam sobre os filhos, os maridos e os trabalhos de casa.
A filha apressa o pai. Ele para numa banca, pega uma atemoia nas mãos…. “Era essa que sua irmã queria…” “Deixa isso, pai! ela não está nem lembrando, vamos!” “Mas eu gosto tanto…” “Vamos, pai, anda logo!!” E eu penso em como tenho medo da pressa.
O senhor que vende café moído na hora aproveita para jogar xadrez e o cheirinho do café faz o serviço sozinho.
A dupla de policiais que circula pela avenida é de velhos conhecidos, param com todos e jogam uma conversa fora, porque ninguém é de ferro.
A senhora resolve parar na banca do queijo e reclamar que o “dinheiro não está dando pra nada, meu filho…”… é a crise, é a dilma, é o governo… mas o preço do queijo é o mesmo tem dois anos, conta o senhor da banca pra ela e por ele está tudo bem.
“Saúde é R$1.20 o quilo e está acabando!”, canta alto o moço das melancias.
E o menino mais lindo de toda a feira tem uns 9 anos e vende cenourinhas ao lado da mãe e do pai. Cheio de prosa, ele ensina o jeito que adora comer cenoura. Todos os domingos eu passo por ele, fico olhando de longe pra ver como ele está, tem dias que ele sorri mais para quem passa, tem dias que está sério, mas é sempre o menino mais lindo da feira.
O senhor do chapéu de palha que vende frango ensina a fazer farinha com os ossos torrados.
E a mexerica aberta acaba rapidinho, de mão em mão os gomos vão se acabando e as sacolas de uma dúzia vão seguindo viagem. “Mexerica vende muito”, diz a mulher ao marido, ele carregando todas as sacolas, ela escolhendo o que precisam.
E na banca dos biscoitos a senhorinha dos cabelos bem branquinhos compra de todos os tipos de biscoito, porque hoje “os netinhos vão lá pra casa passar a tarde”.
E assim a feira encanta. Traduz em imagens o que vai pela alma. A feira faz rir, faz admirar, faz indignar, faz perceber os nossos desassossegos, faz acordar, faz encher as sacolas e ir para casa abastecida de frutas, verduras e histórias.
Paula Quintão. 26 de julho de 2015
Que delícia de texto Paula, uma feira de sensações.Adorando passear por essa sua fira super equipada.
E que delícia ter você comigo nessa caminhada pela feira, Karol! Uma boa semana pra nós!
Que delícia de feira. Lembrei de quando ia com minha avó à feira em São Paulo, uma rua que em dias normais era super movimentada, mais em dia de feira é que realmente podíamos ver sua agitação. Tinha uns 8 anos assim como o menino com seu avô, e realmente eu olhava tudo curiosa, encantada, o mundo nos parece maior quando somos crianças. Lembro do cheiro do pastel e do carrinho de feira da minha avó. Boas lembranças, eu só queria crescer logo e morar em um apartamento daquele bairro, Bela Vista, e não era atoa. Hoje o que mais aprendo com você é como tudo, exatamente tudo que vivemos vira história para se contar, por mais que não damos valor em meio ao caos da sobrevivência. Gratidão!